Avivamento e Santidade

Leonard Ravenhill, ardoroso escritor e pregador, disse que “a maior vergonha dos nossos dias é que a santidade que apregoamos é anulada pela impiedade do nosso viver”.

Há um divórcio entre o que a igreja prega e o que a igreja vive. Há um hiato entre o sermão e a vida, entre a fé e as obras. Não vivemos o que pregamos e pregamos o que não praticamos.

Uma das coisas mais extraordinárias que já presenciei foi a vida dos crentes de Kwa Sizabantu – África do Sul. Ouvi deles próprios: “Aqui se vive o que se prega e prega-se o que se vive”. Foi exatamente isso que vi ali – uma igreja vivendo em santidade.

Stanley Jones, ilustrado escritor e missionário, conhecedor profundo da alma humana e das lides do Reino, disse depois de acurada investigação: “O maior inimigo do cristianismo não é o ateísmo, nem o budismo, nem o hinduísmo, nem o islamismo, nem o materialismo, nem o romanismo, tampouco o espiritismo; é o subcristianismo”. 

Não há nada mais trágico do que um crente profano como Esaú. Nada mais é tão escandaloso quanto um cristão viver sem santidade. Deus nos escolheu antes da fundação do mundo para sermos santos (Ef 1.4). Escolheu-nos desde o princípio para a salvação, pela santificação do Espírito (2 Ts 2.13). Por isso, a maior pedra de tropeço é alguém dizer-se crente e viver como se Deus não existisse (Tt 1.16). O crente carnal e mundano é pior do que o ateu. Nada há mais deformado do que uma ortodoxia gelada, morta, desprovida de piedade. Nenhum veneno é tão mortal quanto uma pessoa dizer-se crente e viver uma vida mundana e compactuada com o pecado.

Muitos crentes o são apenas de rótulo. Por fora, ostentam o nome de crentes, mas por dentro são mundanos. Muitos são como aquele jovem que vivia dizendo impropérios e praticando impiedades abomináveis, até que um dia foi gravemente acidentado. Quando levado à sala de cirurgia, descobriu-se uma grande tatuagem de Jesus Cristo em seu peito. Esse é o retrato de muitos crentes. Só têm Jesus por fora, só têm o Jesus da tatuagem, que fica do lado de fora do coração. Só têm rótulo, só têm fachada; não conhecem o poder da santidade de Jesus.

Certa feita, Alexandre, o Grande, passava em revista a sua tropa. Era severo com os seus soldados e nunca aceitava covardia da parte deles. Homem guerreiro, valente, jamais recuou diante do inimigo no fragor da batalha. Era um conquistador inveterado, um expansionista sem precedentes. Quase todos os que eram levados perante ele, assentado em seu trono de pompa e glória, eram severamente castigados por seus delitos. Entretanto, dentre os demais, aproximou-se um jovem simpático, meigo, que conquistou logo a simpatia do rei. Então Alexandre perguntou ao comandante:

– Que acusação pesa contra este soldado?

– Majestade, respondeu, ele foi apanhado fugindo do inimigo e escondendo-se em uma caverna.

O rei enrubesceu a face e ficou irado. Ele não tolerava covardia. Mas a compaixão e a simpatia voltaram ao coração do rei, e, mostrando-se benigno para com o soldado, perguntou-lhe:

– Soldado, qual é o seu nome?

– Alexandre, meu senhor, respondeu o jovem aliviado.

Alexandre, então irado, perguntou-lhe segunda vez:

– Soldado, qual é o seu nome?

E o soldado, gaguejando, respondeu-lhe:

– Alexandre, senhor.

Alexandre, num ímpeto de fúria, saltou de sua cadeira, agarrou o soldado pela camisa, jogou-o com força ao chão e, com o dedo em riste, disse-lhe:

– Soldado, mude de nome ou mude de conduta.

E Jesus lhe pergunta:

– Qual é o seu nome?

– Cristão, meu Senhor, responde você.

Mas como pode então viver deleitando-se com pecados que levaram Jesus à cruz? Como pode levar uma vida impura e sem santidade?

Mude de nome ou mude de conduta. É impossível ser cristão e mundano ao mesmo tempo. Não é coerente carregar o nome de cristão e viver comprometido com o pecado. A ausência de santidade é a causa do nosso fracasso e o grande obstáculo ao avivamento. Deus não usa vasos sujos. A falta de santidade emperra, amarra e desacredita a igreja.

Os evangelistas da Índia foram evangelizar o grande líder indiano Mahatma Gandhi. E ele contra-atacou com uma bomba: 

“No vosso Cristo eu creio, eu só não creio é no vosso cristianismo.”

O apóstolo João disse que “aquele que diz que permanece nele (em Cristo), esse deve também andar assim como ele andou” (1 Jo 2.6).

Quando a vida da igreja não é coerente, transparente, santa e irrepreensível, sua pregação é vazia, pobre, desacreditada e infrutífera.

A igreja tem sofrido derrotas fragorosas porque a santidade não é mais a sua ânsia maior. Os crentes vivem mais preocupados com o ter do que com o ser. Correm mais atrás de maravilhas do que de santidade. Buscam mais sinais do que vida certa com Deus. Estão mais interessados no seu bem-estar do que na glória de Deus. Interessam-se mais pela teologia da prosperidade do que pela teologia da santidade e da integridade. Buscam mais os resultados e os efeitos do avivamento do que as causas do avivamento. Por isso, muitos são mornos como os crentes de Laodiceia; estão mortos como os crentes de Sardes; comprometidos com a prática da imoralidade como os crentes de Tiatira; compactuados com o espírito ganancioso dos crentes de Pérgamo; e abandonaram o primeiro amor como os crentes de Éfeso.

Quando a igreja não se santifica, ela murcha. Quando se mistura e se amolda ao mundo, perde sua identidade e seu poder. Quando deixa de ser um povo diferente e separado, perde a autoridade de ser embaixatriz de Deus. Quando se faz amiga do mundo, torna-se inimiga de Deus. Quando perde o amor à santidade e passa a amar o mundo, torna-se o maior impedimento à ação de Deus na história.

É triste ver tantos soldados tombando na linha de frente do combate; tantos pastores fora do ministério por adultério; tantos líderes imiscuídos em práticas pecaminosas; tantos jovens vencidos, não por serem abertamente atacados, mas por se envolverem na trama e na cilada do inimigo.

O diabo nunca é tão perigoso como quando vem manso, inofensivo, com voz suave, doce. A sedução é pior do que a perseguição. A camaradagem do mundo é pior do que a sua espada.

As igrejas estão cheias de pessoas vazias, e vazias de pessoas cheias de Deus e de santidade. As igrejas estão copiando o mundo, imitando o seu falar, cantar, vestir, negociar, agir e reagir.

Os crentes não querem ser diferentes. Pensam ganhar o mundo tentando ser igual ao mundo. Como é difícil identificar um crente pela sua vida. Os crentes usam a mesma linguagem torpe, contam as mesmas piadas imorais, assistem às mesmas novelas indecentes, leem as mesmas revistas pornográficas, servem as mesmas bebidas alcoólicas em suas festas, namoram com a mesma licenciosidade, negociam com a mesma desonestidade com que agem aqueles que não conhecem a Deus.

Por outro lado, há crentes que são verdadeiros agentes secretos de Cristo. Não vivem vidas santas, não falam com autoridade irresistível, não demonstram poder em suas obras. Conseguem viver secretamente. Conseguem colocar a sua luz debaixo do alqueire, do vaso, da cama e no porão.

Quando as águas do dilúvio estavam baixando, certamente subiu um grande mau cheiro em toda a terra. Animais, aves, répteis e homens estavam sepultados na lama e nos escombros catastróficos daquele cataclismo universal. Noé, então, soltou um corvo da arca. Ele foi e voltou várias vezes à arca, porque a água ainda cobria a terra. Mas, certo dia, ele foi e não mais voltou. É que ele encontrou lama, podridão, e, por isso, preferiu ficar. Achou restos apodrecidos, deteriorados, fétidos, nauseantes, e ali ficou. Não fez como a pomba, que regressou à arca e só saiu depois que a terra já estava seca.

Há crentes que são como o corvo, têm atração por coisas podres, vivem botando o pé em todo lugar lamacento e mal cheiroso, emporcalhando suas vidas, manchando a sua honra e jogando lama no santo nome de Jesus. Muitos têm mais prazer na roda dos escarnecedores do que na casa de Deus.

Há ainda aqueles que se desviaram da verdade, e estão hoje revirando a podridão do mundo, envolvidos com drogas, alcoolismo, cigarro, jogos, adultério, desonestidade, e nem se lembram mais da igreja. Como o corvo, preferem lama à arca.

Outros permanecem na igreja, mas o coração está no mundo. Frequentam os cultos, mas não desligaram a mente das concupiscências do pecado.

Como a igreja hoje precisa de santidade! Sem santidade não há evidência de justificação. Sem santidade não há salvação. Sem santificação ninguém verá o Senhor. Só os puros de coração verão a Deus. Só a santidade nos torna vasos de honra, úteis para toda a boa obra. A santidade é o caminho de comunhão com o Deus santo; é o caminho do avivamento.

João Batista exprimiu essa ideia em Lucas 3.4-6. É este o desafio: “Preparai o caminho do Senhor”. Devemos ser um meio de acesso a Cristo através do qual ele possa revelar-se. Temos de ser caminho e não pedra de tropeço; ponte de passagem para Cristo, e não abismo que impede as pessoas de vê-lo.

O que significa “preparar o caminho do Senhor”? Nesse ato está implícito o roteiro bem como o preço do avivamento.

Em primeiro lugar, se queremos que o Senhor se manifeste, precisamos aterrar todos os vales.

Muitos de nós têm uma vida cheia de depressões, de vales, de covas, de vãos existenciais. Que vales são esses? Podem ser mau gênio, ciúme, amargura, ódio, ressentimento, baixa autoestima, complexo de inferioridade, solidão, tédio. Há crentes levando uma vida esmagada, achatada, cheia de depressões, vivendo num buraco, num sepulcro existencial. É preciso aterrar esses vales, sair do fosso, da fossa, da cova.

O vale traz também a ideia de separação, de divisão. Temos dentro da igreja falta de comunhão, brigas, rixas, disputas, contendas, politicagens, desarmonias, críticas amargas, acusações levianas, maledicências demoníacas, malquerenças diabólicas e mentiras destruidoras. Esses vales precisam ser aterrados, se pretendemos preparar o caminho para o avivamento.

Em segundo lugar, todos os montes e outeiros precisam ser nivelados.

Há muitos montes que obstaculizam a preparação do caminho para a manifestação do Senhor. O Senhor não se manifesta onde há os montes da soberba e do orgulho. Deus resiste fortemente ao soberbo. O querubim da guarda, o sinete da perfeição tornou-se Satanás, porque o orgulho e a soberba tomaram conta do seu coração. Deus não tolerou orgulho no céu e expulsou de lá os altivos.

Onde há presunção e mania de grandeza, não pode haver avivamento. Onde os crentes buscam glória para si mesmos, não há espaço para Jesus manifestar-se. Onde os crentes buscam aplausos e promoção pessoal, aí o Espírito não é derramado.

Em 1966, quando o povo zulu, na África do Sul, estava orando por avivamento, Erlo Stegen recebeu um grupo para oração, e ficou envergonhado de ajoelhar-se junto com os negros diante de pessoas ilustres que estavam perto da casa onde se reuniram. Entrou e encaminhou-se para fechar a janela, evitando que alguém o visse ajoelhado com os negros zulus. Mas o Espírito Santo lhe disse: “Se você fechar a janela, eu fico do lado de fora”. Erlo caiu em si e, consciente de ser o maior obstáculo ao avivamento, humilhou-se. Não tardou para que o avivamento chegasse.

A incredulidade interpõe-se no caminho do avivamento como montes que precisam ser cortados pelo arado de Deus. Onde há incredulidade, Deus retém as suas bênçãos. A incredulidade foi a causa de Jesus não ter feito muitos milagres em Nazaré; foi a causa de o povo de Israel vagar quarenta anos no deserto.

Muitos oram por avivamento, mas não creem que Deus possa fender os céus. Muitos pedem, mas não esperam receber. A falta de fé nos faz pequenos e incapazes diante do inimigo; torna-nos gafanhotos em vez de príncipes; faz-nos soçobrar engolidos pelos vagalhões enfurecidos.

Em terceiro lugar, precisamos retificar e endireitar os caminhos tortuosos.

Se queremos avivamento, é preciso endireitar os caminhos tortuosos da mentira. Quantas vezes mentimos em pensamentos, palavras e atos? Muitos mentem para a esposa, para o marido, para os pais, para os filhos, para a igreja, para Deus. Mentem na escola, nos negócios, na declaração do imposto de renda, na entrega dos dízimos. A mentira é do diabo. Ela impede a chegada do avivamento.

Outro caminho tortuoso é a vida dupla. Muitos crentes são atores e fazem da vida um teatro, onde usam inúmeras máscaras, onde representam diversos papéis. Muitos são como Naamã, heróis fora de casa, mas leprosos dentro do lar. Outros, à semelhança de Moisés, continuam com o véu sobre a face, quando não há mais glória no rosto. Ainda outros arrotam santidade, mas por dentro estão cheios de impureza. Na igreja, são piedosos, e mundanos dentro do lar. São amáveis com os de fora e grosseiros com os membros da família.

Enquanto esses caminhos tortuosos não forem endireitados, não haverá esperança de o Senhor se manifestar.

Em último lugar, os caminhos escabrosos precisam ser aplanados.

Escabroso significa “fora do devido lugar”. Muitos crentes acham-se fora do lugar, fora do centro da vontade de Deus. Como Jonas, tentam fugir de Deus. Como Adão, escondem-se de Deus. Como Ananias, mentem para Deus. Como Acã, escondem seus pecados. Como Sansão, envolvem-se emocional e sentimentalmente fora da vontade de Deus. Como Geazi, cobiçam cegamente as riquezas deste mundo. Como Esaú, são impuros e profanos. Como Nadabe e Abiú, rebeldes com seus líderes. Como Saul, jogam lanças e farpas contra os ungidos de Deus. Como o sumo sacerdote Josué, ministram na casa de Deus, mas com vestes sujas. Como Diótrefes, cheios de ciúmes, amantes da primazia, buscam glórias para si. Tais crentes não estão no devido lugar, e por isso são obstáculos à chegada do avivamento.

Quando a multidão, os publicanos e os soldados ouviram João Batista proferir seu solene sermão, quiseram saber quais as implicações práticas de sua mensagem. E a resposta de João Batista foi que o arrependimento, a preparação do caminho para o avivamento requer: generosidade no dar (Lc 3.10,11); honestidade nos negócios (Lc 3.12,13); justiça nos relacionamentos (Lc 3.14); integridade na palavra e na comunicação (Lc 3.14); não aceitação de suborno e propina (Lc 3.14).

Quando a igreja se santifica e prepara o caminho do Senhor, Deus se manifesta; quando ele se revela, toda a carne vê a salvação de Deus (Lc 3.6).


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Hernandes Dias Lopes é pastor da Primeira Igreja Presbiteriana de Vitória desde 1985. Pastor colaborador da Igreja Presbiteriana de Pinheiros, em São Paulo. Conferencista e autor de mais de 150 livros publicados. O presente artigo foi extraído do seu livro Avivamento Urgente, publicado pela Betânia.

2 comentários

Adriano Souza Nascimento

Bom, a fonte é muito confiável da mensagem. O Pastor Hernandes Dias Lopes, homem dedicado á obra do Senhor, e com o corpo místico de Cristo na terra. nos alerta veementemente aos discípulos a viverem em santidade e compromisso com o reino. Dito isto; confesso que estamos vivendo dias onde Deus está santificando o seu povo para a obra que será manifestada em tempo oportuno, conforme a multiforme sabedoria de Deus!

Milton Tobias Prudêncio

Até hoje aos 83 anos de idade não tinha lido o que vem a ser um verdadeiro Cristão. Mercê da longa análise do Pastor Hernandes Dias Lopes verifiquei que a rigor nunca fui Cristão e sim que venho tentando ser Cristão. Justo eu que abomino tudo que não presta! Agora compreendo por que Deus deu o Filho dele como Cordeiro. Se Ele não salvar, o destino é a destruição da alma!

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