O dia da mentira e a hora da verdade

Pastor Marcelo Aguiar

 

            Uma das datas mais provocadoras do nosso calendário é o dia primeiro de abril, no qual muitos comemoram “o Dia da Mentira”. Ninguém sabe ao certo como essa tradição começou. Há relatos de datas destinadas a pregar peças e enganar pessoas remontando à Europa medieval. Alguns historiadores sugerem que essa tradição tenha se associado ao dia primeiro de abril na França, quando os cidadãos que se recusaram a aceitar o novo calendário criado por Carlos IX foram ridicularizados (no calendário anterior, o ano começava em primeiro de abril). Seja como for, o Dia da Mentira atravessou o espaço e o tempo, chegando ao Brasil da nossa época.

            A princípio, uma ocasião destinada a pregar peças e fazer brincadeiras pode parecer algo inofensivo: uma expressão lúdica do folclore das nações visando trazer um pouco de leveza às cansativas exigências da vida cotidiana. Mas as coisas podem não ser assim tão simples. Se no Carnaval os indivíduos dão vazão a seus instintos menos nobres, recebendo uma espécie de “autorização para pecar”, no primeiro de abril as pessoas revelam de que maneira gostariam realmente de usar as suas línguas, recebendo uma “autorização para mentir”. Tanto em um caso quanto no outro, homens e mulheres acabam por revelar aquilo que existe em seus corações.

             Verdades distorcidas e notícias inventadas já provocaram o fim de amizades, a destruição de casamentos, a divisão de igrejas e até mesmo a eclosão de guerras, trazendo sofrimento a muita gente. Nos dias atuais, as chamadas fake news se tornaram motivo de controvérsia, pois, com a agilidade da comunicação proporcionada pelo avanço da tecnologia, aumentou, também, a velocidade com que as mentiras se alastram e a quantidade de pessoas enganadas por elas. Onde está a verdade? Em quem acreditar? A questão ganha contornos práticos e filosóficos. O relativismo pós-moderno, ao declarar que a verdade não existe e que cada um possui a “sua” verdade, contribui ainda mais para esse cenário de incertezas.

            Porém, quando nos voltamos para as Escrituras Sagradas, toda a incerteza acaba. A Bíblia não hesita em declarar, abertamente, que a mentira é um mal. Através de uma mentira, Satanás enganou o primeiro casal e trouxe o pecado ao mundo (Gn 3.4). Por isso, o diabo é chamado, com acerto, de pai da mentira (Jo 8.44). O anticristo, seu enviado, usará de toda sorte de mentiras (2 Ts 2.9). Os ídolos são vistos como a mentira dos povos (Jr 10.14). As testemunhas mentirosas terão que acertar contas com a justiça divina (Pv 21.28). E os mentirosos ficarão de fora do céu (Ap 22.15).

Não deveríamos brincar com coisas perigosas como eletricidade, veneno, escorpiões... e mentiras. Na Palavra de Deus, não encontramos nenhuma tolerância para com “mentiras brancas”, meias-verdades”, “escorregões” ou “mentirinhas”. Mentira é mentira, e ponto final. “Como louco que lança fogo, flechas e morte, assim é aquele que engana o seu próximo e diz: ‘Fiz isso por brincadeira’”, diz a Escritura (Pv 26.19,20 – naa). Isso vale tanto para o primeiro de abril quanto para os demais dias do calendário. Não devemos tentar nos divertir com algo que o diabo inventou. Simplesmente não vai dar certo. Não vai acabar bem.

O cristão precisa assumir um compromisso inegociável com a verdade, porque o seu Deus é um Deus de verdade (Dt 32.4). O Senhor não é homem para que minta (Nm 23.19). O Senhor ama a verdade (Sl 51.6). Os conselhos do Senhor são verdade e firmeza (Is 25.1). O Espírito do Senhor é a verdade (1 Jo 5.6). O Senhor santifica os seus filhos na verdade, e a sua Palavra é a verdade (Jo 17.17). Por isso, a nossa palavra deve ser sim, sim, e não, não: o que passar disso vem do Maligno, e não do Senhor (Mt 5.37).

Nos dias em que vivemos, a verdade está sob constante ataque. Alguns dizem que a verdade não existe. Outros sacrificam a verdade no altar da popularidade e da aceitação pública. E muitos abrem mão da verdade porque não acreditam que ela compense. Como o personagem infantil Pinóquio (criado pelo escritor italiano Carlo Collodi em 1883), deitam-se em uma rede de mentiras e acabam aprisionados nela. Isso acontece porque – como afirma o antigo ditado – a mentira tem pernas curtas. Ela não vai muito longe. Cedo ou tarde, teremos que dar contas das nossas ações e das nossas palavras. Cedo ou tarde, teremos que nos haver com a verdade.

A mentira pode parecer o caminho mais fácil, mas jamais levará a um bom lugar aqueles que fizerem uso dela. No começo do século passado, Rui Barbosa, desencantado com a situação política e moral do Brasil, afirmou: “De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra; de tanto ver crescer a injustiça; de tanto ver agigantar-se o poder na mão dos maus; o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto”. Entretanto, não deveríamos pensar desse modo. No final, a verdade triunfará, porque o Senhor é o Deus da verdade. Ele abomina a mentira. Ele recompensa a virtude. O Senhor trará à tona o que está encoberto e se encarregará de fazer com que a verdade prevaleça. Como afirmou Jesus, “no Dia do Juízo as pessoas darão conta de toda palavra inútil que proferirem” (Mt 12.36 – naa).

O Dia do Juízo será a hora da verdade. Ali será conhecido o conteúdo dos corações, ali será vindicada a justiça de Deus. Esse dia chegará para todos nós, e, portanto, devemos viver preparados para ele. Para isso, é fundamental conhecermos, falarmos, praticarmos e defendermos a verdade. Temos que saber de quem somos filhos. Temos que definir de que lado estamos. Temos que nos firmar na verdade. “Senhor, quem habitará no teu tabernáculo? Quem poderá morar no teu santo monte? ”, pergunta o Salmo 15. E ele mesmo responde: “Aquele que vive com integridade, que pratica a justiça, e, de coração, fala a verdade; aquele que não difama com a sua língua, não faz mal ao próximo, nem lança injúria contra o seu vizinho” (Sl 15.1-3 – naa). Será que nos encaixamos nessa descrição?

Antes que chegue a hora da verdade, façamos, de todos os dias do nosso calendário, o Dia da Verdade. Conheçamos e pratiquemos os preceitos bíblicos. Sejamos honestos em nossos negócios e relacionamentos. Paguemos o preço da correção, da transparência e da integridade. O mundo jaz no maligno, acreditando nas suas mentiras e escutando apenas aquilo que é agradável aos seus ouvidos. Deus, entretanto, deseja algo melhor para nós. Ele quer que tenhamos uma vida abundante e eterna. Sendo assim, acreditemos na sua Palavra, seguremos a sua mão, e sigamos na direção que ele nos aponta. Essa é a única maneira através da qual um ser humano pode ser vitorioso. “Porque nada podemos contra a verdade, senão a favor da verdade.” (2 Co 13.8 – naa.)

 

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Marcelo Rodrigues de Aguiar é casado com Rosi, e pai das gêmeas Amanda e Beatriz. Pastor da Igreja Batista em Mata da Praia, na cidade de Vitória, Espírito Santo. Atua também como psicólogo clínico, e tem várias obras publicadas sobre aconselhamento e cura interior.

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